jueves, 20 de octubre de 2022

Leonidas Donskis (Z. Bauman & L. Donskis, Cegueira moral)

 


"Sua vida profissional e toda a sua existência são consideradas legítimas enquanto houver uma instituição por trás de você. Sem isso, você perde elementos de sua identidade e se torna um ninguém [...].

Que tipo de pessoas teriam sido Descartes, Spinoza, Pascal, Leibniz ou Locke no mundo de hoje? Charlatães, lunáticos ou insignificâncias absolutas. Foram pessoas do início da modernidade, ou da primeira modernidade, autossustentável e ainda não autodestrutiva, que prolongaram o Renascimento. Hoje provavelmente não saberíamos nada sobre eles, já que não estariam ligados a nenhuma instituição acadêmica conhecida. A fixação e o “confinamento” de intelectuais e pensadores a instituições acadêmicas ocorreram no século XIX. É interessante que Oswald Spengler, que odiava e desprezava os filósofos acadêmicos, não tenha submetido sua obra A decadência do Ocidente à revisão de professores universitários, mas de um intelectual da política, o ministro de Relações Exteriores alemão em 1922, Walther Rathenau.

Sem completar o doutorado nem se adaptar ao mundo acadêmico, Ludwig Wittgenstein talvez tenha sido o último grande filósofo não acadêmico ou semiacadêmico do mundo ocidental. Mas sua popularidade só se generalizou no período que ele passou em Cambridge, e sobretudo graças a seus alunos e seguidores. Michel Foucault quase desapareceu na obscuridade do mundo acadêmico – o que significava de todo o campo existencial – ainda jovem, quando a Universidade de Uppsala, onde lecionava, rejeitou como indefensável sua tese de doutorado sobre a história das ideias. Agora isso pode parecer um lapso estranho e infeliz da academia sueca, mas é um fato sintomático do estado atual do mundo acadêmico – a estrada que leva da grandeza à inexistência, ou vice-versa, é curta e imprevisível.

Não pode haver outra alternativa num mundo que reconhece um método, um grupo ou uma instituição, mas não um indivíduo criativo."


Leonidas Donskis (1962-2016) In: Zygmunt Bauman e Leonidas Donskis, Cegueira moral: A perda da sensibilidade na modernidade líquida, RJ, Zahar, 2013.

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